segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Senhor Eu



Nunca fui muito destas coisas de escrever sobre relacionamentos amorosos mas há cerca de duas semanas estive no aeroporto de Lisboa à espera de uma amiga minha horas e horas a fio porque o voo dela tinha se atrasado, e pior que isso, tinham perdido a bagagem. Por isso foram quase quatro horas sozinha, a apreciar todos os recantos do aeroporto, a contemplar a felicidade dos que chegavam e tinham a família toda à espera e outros, que tal como eu, resmungavam dizendo para o ar "estou aqui, estou a criar raízes".
Depois de devorar quase um pacote de caramelos fui comprar revistas para passar o tempo. As minhas amigas dizem que eu "folheio" as revistas, não as leio. Talvez seja verdade, na maior parte dos casos vou folheando, a ver as caras, os vestidos, sapatos, as festas. O resto não me interessa muito, verdade seja dita. Mas numa das revistas estava um artigo que me chamou à atenção da Margarida Rebelo Pinto. Sou sincera, já tentei ler vários livros dela mas só consegui ler um do princípio ao fim, ainda quando era mais nova, o "I'm in love with a Popstar". Gostei imenso e consegue fugir aos cenários repetitivos em que ela teima escrever: mulheres divorciadas ou solteiras cuja vida é retratada por uma panóplia de relacionamentos amorosos desastrosos, um ambiente carregado de frustração e desânimo. De vez em quando lá aparece um príncipe montado num cavalo branco que mais tarde ou mais cedo se vai mostrar outro cobarde... 
Enfim, eu parei neste texto que a M.R.P escreveu e tive curiosidade em lê-lo porque o título me chamou bastante à atenção: "Senhor Eu". 

“Narciso amava-se acima de tudo, e de tanto amar a sua imagem, esse amor cego, estéril e egoísta não o deixava amar mais ninguém.
O mito de Narciso continua vivo e de boa saúde por entre alguma rapaziada que se acha de tal forma o máximo, que o facto de dar atenção a uma mulher e de ter tempo para ela é uma espécie de bónus, uma benesse quase extraordinária e, como tal, digna de elogios e gratos louvores. Os narcisistas não só pensam sempre primeiro neles, como não sabem pensar em mais ninguém; falta-lhes essa maravilhosa qualidade de carácter de animais de espécies mais evoluídas, nomeadamente que os golfinhos e os cães possuem, a empatia. A empatia é a faculdade de entender os desejos dos outros, ferramenta fundamental para o bom entendimento amoroso.
Um namorado/amante/amigo/marido que não tenha empatia, não tem quase nada. Ele até pode ter charme, inteligência, graça, beleza e a melhor performance do mundo, mas sem pequenos gestos de generosidade, de atenção e de solidariedade para com a sua amada, nunca irá longe. A empatia está para as relações como o azeite está para as saladas; sem ele, nada feito. Sabe tudo a palha e comida de grilo.
Infelizmente é muito difícil explicar ao Senhor Eu que lhe falta alguma coisa, porque como ele se acha perfeito, a margem para críticas, ainda que construtivas, é praticamente inexistente. Ao mais leve reparo, ele justifica-se e vira o tabuleiro contra nós, inventado argumentos para nos provar que nós é que estamos mal. O Senhor Eu vive sobretudo dentro da sua própria realidade e por isso acha-se sempre o máximo, mesmo que seja um cantor pimba de província (...). 
O Senhor Eu gosta de praticar sexo ao espelho para ver a sua performance, fala de si mesmo na terceira epssoa, pergunta-te frequentemente se sabes com quem estás a lidar, não percebe porque é que todas as mulheres acham que o George Clooney é tão giro e compra-te uns óculos espelhados para que ele possa admirar a sua própria imagem sempre que olhas para ele. É egocêntrico, egoísta, não raro mitómano e acha-se sempre mais alto, mas giro e mais inteligente do que na realidade é. Nunca perde oportunidade de se olhar ao espelho, alisar o cabelo, encher o peito e de dizer que é o maior, mesmo que ninguém tenha perguntado nada. A não ser que uma mulher tenha nascido com vocação de lambe-botas, preparada e motivada para ter como única função na vida estimular-lhe o ego, sem espaço para vontades próprias, manter uma relação com um parvalhão deste calibre é uma perda de tempo. A melhor maneira de acabar tudo é dizer-lhe que não somos suficientemente boas para ele; certamente ele não irá discordar." 

Eu adorei este texto. Talvez por ultimamente se cruzarem comigo muitas criaturinhas deste género. Tenho a certeza que não sou nenhuma lambe-botas, mas acho que tenho jeito para lidar com o Senhor Narciso, não numa de acenar com a cabeça a tudo o que diz mas, pelo contrário, gozar com o grau de convencidez que o organismo desses seres produz. 

2 comentários:

  1. Dos livros da MRP li-os todos, o que mais gostei foi do "I'm in love with a Popstar", foi o melhor, os outros acho-os um pouco secantes exactamente pelos motivos que falaste.
    Este texto realmente está muito bom, e acredita que andam por aí muitos meninos que precisavam de o ler para abrir a pestana! :0
    Gostei muito do blog e vou seguir!
    Beijinhos

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  2. quando era mais nova também li o "i'm in love with a popstar" e adorei..já os outros não gosto tanto, deprimem-me um bocado! quanto ao que disseste sobre o texto também sou assim! :)

    http://fashioninla-go-svegas.blogspot.com/

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